Porque sabes que eu estou aqui.
Porque eu sei que me sabes ler no silêncio.
Domingo, 15 de Agosto de 2004
José Luís Peixoto
quando os nossos corpos se separaram olhámo-nos quase a desejar ser felizes. vesti-me devagar, o corpo a ser ridículo. disse espero que encontres um homem que te ame, e ambos baixámos o olhar por sabermos que esse homem não existe. despedimo-nos. tu ficaste para sempre deitada na cama e nua, eu saí para sempre na noite. olhamo-nos pela última vez e despedimo-nos sem sequer nos conhecermos.
Quinta-feira, 12 de Agosto de 2004
Miguel Sousa Tavares
A memória é a nossa escola de vida. É a nossa única verdadeira defesa contra a traição e o abandono. Tudo pode ser traído e abandonado menos a memória. É mais fiel que qualquer amigo, é mais longa que a própria vida é mais verdadeira do que qualquer verdade que temos como certa.
Não posso negar o que vi, o que cheirei, o que senti, o que amei. Não posso negar que fui feliz, se fecho os olhos e sinto outra vez todos os instantes felizes. Não não posso negar que atravessei rios contigo, que te ensinei o nome das estrelas, que ouvimos juntos os pássaros e o vento nas árvores, que caminhei pelas ruas de mãos dadas contigo..
Enquanto me lembrar estarei vivo, porque esse é o mais certo indício de vida. Eu estarei vivo e, vivendo, não deixarei morrer quem caminhou comigo, ao longo do caminho..
Quarta-feira, 11 de Agosto de 2004
...
Dispo-me e deito-me sobre ti como ultimo hospede. Como um tempo passado, uma lembrança vaga, uma saída planejada. O meu corpo dorme e habita nas tuas mãos. Sobre a memória da minha pele persiste ainda a memória das tuas mãos a devassar inconfessáveis anseios, gemidos que ferem o perfeito silencio. A tua presença pressentida desarruma a rotina.
Terça-feira, 10 de Agosto de 2004
Fernando Pessoa, em "O Eu Profundo"
"Tenho pensamentos que, se pudesse revelá-los e fazê-los viver, acrescentariam nova luminosidade às estrelas, nova beleza ao mundo e maior amor ao coração dos homens."
Domingo, 8 de Agosto de 2004
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É assim a minha vida... o cinzento não mudou... desde que te foste embora vivo pra esquecer... Vivo por viver... se vivo estou...
The Hours
"Vivo numa vida que não me apetece viver. Vives sob a ameaça, dizes tu, sob a ameaça do meu desaparecimento. Mas também eu vivo sob ela.
É esse o meu direito, o direito de qualquer ser humano...quem dera por ti poder ser feliz nesta quietude. Mas se tiver de escolher entre ti e a morte, eu escolho a morte. Não se encontra a paz fugindo a vida.
Tenho a certeza que estou de novo a enlouquecer. E sinto não podermos aguentar mais outra dessas horas terríveis nem que desta vez recuperarei.
Comecei a ouvir vozes e não me consigo concentrar. Portanto vou fazer o que me parece mais razoável.
Proporcionaste-me a maior felicidade que poderia esperar, tu foste sob todos os ângulos, tudo o que alguém pode ser.
Sei que estou a arruinar a tua vida e que sem mim poderias trabalhar. E hás-de trabalhar. Eu sei que sim.
Como vês, nem este bilhete consigo que faça sentido.
O que te quero dizer é que te devo a ti toda a felicidade que tive na vida, foste para comigo duma paciência infinita. E inacreditavelmente bondoso. Esqueci-me de tudo menos da certeza da tua bondade. E não vou continuar a arruinar mais a tua vida.
Não creio que duas pessoas possam alguma vez ter sido mais felizes do que nós fomos.
Olhar a vida de frente, olhá-la sempre de frente, e saber como ela é.
Finalmente sabê-lo. E amá-la pelo que ela é e depois pô-la de lado.
Entre nós sempre os anos. Os anos sempre.
Sempre o amor
Sempre as horas."
Sábado, 7 de Agosto de 2004
Espaço vazio entre palavras
Gosto de falar contigo pois, sempre que o faço, sinto que falo também comigo. Sei que soa um pouco estranho, demasiado até, mas, apesar de me agradarem estas conversas que inicio interiormente sempre que digo algo, ainda não compreendi se isto são monólogos que mantenho contigo, se diálogos que mantenho comigo. E gosto. Como me apraz o teu silêncio, não é simplesmente um espaço vazio entre palavras, não é uma pausa para respirar, é uma longa palavra exprimindo um sentimento que apenas eu compreendo, um segredo só meu, só nosso. É óptimo quando encontramos alguém que fala a mesma língua que nós. Em silêncio.