Escrevo-te enquanto um arrepio me toma numa vertigem que me enche o coração de ausência pavor e saudade. Queria que soubesses que hoje corri para o telefone para te contar o sonho que tive ontem e me aterrorizou. Ainda me lembro do teu número. Queria apenas ouvir a tua voz perguntar quem fala. O número que podia marcar já não te pertence e ligar para tua casa seria reviver o pior momento. Tenho sempre tanto para te dizer nos fragmentos da noite. É nas madrugadas que sinto mais a tua falta. Sempre nos tivemos fora de horas. Levanto-me do fundo de ti e num soluço de respiração procuro vida no rumor de mãos ao de leve pelo meu corpo. Assalta-me o desejo de te acordar e reinventar tudo de novo e assim saciar a melancolia da memória. Meu anjo mata o cansaço do meu corpo quebrado pela desilusão. Seca o poço turvo de melancolia que carrego no centro dos meus olhos. Toca o vazio que me habita de muitos dias sem desejo. Tantos sonhos, tantas trevas, tanto nada. Por tudo que existe de mais sagrado volta. Por favor peço-te vem. Vamos tentar projectar-nos para um futuro feliz nem que tudo acabe depois no desastre dos recomeçados desejos. A vida vibrou em nós. Não o sentes? Estou de novo ocupado em esquecer-me antes que a manha se abata e o sono me tome. Nestas horas nada sei de mim. Quantas noites, quantos dias, quantos anos se irão esgotar na espera? Uma vida.